Domingos D'Angelo (foto Ludopédio) |
Como
acontece em todo Natal, Literatura na Arquibancada destaca uma personalidade
brasileira de destaque no universo da literatura esportiva.
Aos 75 anos, Domingos D’Angelo é dono de um dos maiores acervos de
livros esportivos (especialmente futebol). Prefere ser chamado de bibliófilo,
ao contrário de “colecionador” como muitos outros existentes no país.
Foram décadas de trabalho para chegar ao estágio atual e “seu” Domingos,
como é carinhosamente chamado pelos amigos, não dá sinais de que vai parar. Com fôlego incansável, decidiu ainda há
alguns anos criar um grupo de literatura e memória do futebol, o Memofut, que
reúne diversos autores, jornalistas, pesquisadores e amantes da literatura
esportiva.
crédito: foto Ludopédio |
Confira a entrevista do Literatura na Arquibancada com mestre Domingos D’Angelo.
Vale
conferir também outra entrevista feita pelo excelente site “Ludopédio”: http://www.ludopedio.com.br/rc/index.php/entrevistas/artigo/482.
Literatura na Arquibancada agradece a cessão de algumas fotos utilizadas
nesta entrevista para ilustrar o nosso papo com Domingos D’Angelo.
Literatura na
Arquibancada:
Fale sobre suas origens e família (avós, pai, mãe, esposa, filhos).
Domingos D’Angelo:
Domingos Antonio D’Angelo Junior ou só Domingos D’Angelo.
Sou filho de
um jornalista e advogado, de classe média, meus quatro avós eram todos
italianos, portanto sou “oriundi” puro, não tenho mistura no meu sangue...Minha
mãe era “prendas domésticas”.
Sou então
filho de jornalista, tio, pai, sogro e ainda resido na rua dos jornalistas...
Superior
Administração de Empresas/Administrador de Recursos Humanos. São-paulino.
Como e quando o
futebol entrou em sua vida?
D.D:
Toda minha infância e adolescência joguei futebol, em vários clubes de
várzea do bairro onde resido até hoje, Jabaquara e no Colégio Mackenzie
(campeonato interno/seleção do colegial). Cheguei a fazer parte do Juvenil do
Estrela da Saúde. Parece que, sou suspeito, era um razoável meio campista/4º
zagueiro.
Neste mesmo período de minha vida frequentei o
Pacaembu, quando menino levado inicialmente pelo meu irmão Luiz e meu Tio João,
adolescente ia sozinho.
Com a inauguração do Morumbi passei a frequentar
o Morumbi, sou proprietária de 4 cadeiras cativas, destas coincidências na
vida, serviam para eu e meus 3 filhos...., agora com 8 netos, fazemos um
revezamento...
Atualmente até vou ao Estádio, não com a frequência ia antes.
L.A:
Quando e por que começou a se interessar pela
literatura esportiva?
Crédito: foto Ludopédio |
O primeiro livro que chamou
minha atenção foi DRAMA E GLÓRIA DOS
BICAMPEÕES, do Armando Nogueira e Araújo Neto, de 1962.
A razão, talvez por gostar
de futebol, talvez pelo texto do Armando Nogueira e Araújo Neto, não saberia
explicar.
L.A:
Como e por que passou a colecionar livros?
D.D:
Na verdade quando eu comecei mesmo a montar
minha biblioteca, não sei precisar com exatidão, deve ter sido há mais ou menos
40 anos, época da edição do “Drama e
Glórias dos Bicampeões”.
Prefiro ser chamado de bibliófilo, colecionador me soa algo “antigo”...
O “por
que?”, também não sei, talvez pela razão, gostar de estudar o futebol.
L.A:
Como e onde está organizada sua biblioteca?
D.D:
Tenho uma biblioteca com
2068 obras com o tema Futebol, em português, localizada em minha residência,
moro numa casa que tem um terreno de 11 x 50 metros, tenho espaço para mais
2000, só falta poder financeiro.
Espaço não me preocupa, o
problema será quando eu tiver “passado” para o lado de lá, quem na família terá
espaço para abrigar a biblioteca?
Tenho planos para que
talvez uma instituição possa absorver.
Todos os livros estão
catalogados em Excel, com titulo, autor, editora, cidade, ano, número de
paginas e data da aquisição.
A biblioteca tem livros
sobre Biografias, Narrativas, História, Clubes, Crônicas, Romances, Ficção,
Dicionários, Infanto-Juvenil, Legislação/Regras, Administração, Psicologia,
Sociologia, Medicina, Táticas e Técnica. Sempre com o tema Futebol.
Estão separados segundo
esta classificação.
Esta organização carece de
um aperfeiçoamento, tenho que colocar nas prateleiras, segundo as normas da
biblioteconomia, numerando o livro e a prateleira. Está situação atual me faz
às vezes demorar em localizar um livro e “neuras” que pudesse ter sido “levado”
por alguém...
L.A:
Destaque algumas obras de seu enorme acervo,
relembrando detalhes destas “conquistas”. (raridades, mais difíceis de comprar,
mais difíceis de encontrar, etc.).
Na verdade
nunca fiz uma busca por livros raros, às vezes ocorreu de comprar algum que
estivesse dentro de minhas condições econômicas.
Destacaria:
1 - As duas edições do primeiro verdadeiro
dicionário do futebol: “DICCIONARIO DO
FUTEBOL”, escrito por Guy-Gay (pseudônimo de um esportista da época),
publicada a 1ª edição em 1922, por Monteiro Lobato & Cia, e a 2ª edição em
1932, pela Civilização Brasileira.
2 - “MANO”,
uma ode do Pai,
Coelho Neto, grande escritor, ao filho, grande atleta, falecido prematuramente.
Que foi motivo de uma resenha deste site. Tenho duas edições: a de 1924,
editado pela Empreza Graphica Editora/RJ e a de 1939 da Livraria Chardron, de Lello e Irmão/Porto/Portugal.
3 - O
livro CONCURSO
LITERÁRIO - 60 ANOS DE FUTEBOL NO BRASIL, editado pela
Federação Paulista de Futebol, em 1955, que considero realmente uma raridade,
com textos dos vencedores do concurso, dentre outros, Thomaz Mazzoni, De Vaney
e Paulo Várzea. Está
precisando urgente de uma encadernação, para proteger a obra.
Atualmente
gostaria de poder ter/ler o livro Veteranos
e Campeões do Leopoldo Sant’Anna.
L.A:
Se tivesse que fazer um ranking dos 10
melhores livros, em cada gênero, quais seriam os eleitos? (crônica, romance,
biografias).
D.D:
Muito difícil escolher o melhor ou melhores.
Recentemente tentei escolher 100 e desisti. De qualquer forma vou tentar fazer
algumas indicações de alguns livros que tenho grande admiração, com base na
memória e certamente esquecendo muita coisa. Como escreveu Nelson Rodrigues: “Não há nada mais relapso do que a memória.
Atrevo-me mesmo a dizer que a memória é uma vigarista, uma emérita
falsificadora de fatos e de figuras”.
Vou me limitar somente aos
seguintes itens, biografias, histórias, crônicas, romances e ficção, e sem
obedecer ao numero 10.
Destacam-se:
O livro do Ruy Castro, Estrela Solitária - Um brasileiro chamado
Garrincha, que ajudou a diminuir o preconceito sobre o tema (futebol e
literatura), Fio de Esperança -
Biografia de Telê Santana, André Ribeiro e O Diamante Eterno, André Ribeiro.
Devem ser lembradas outras
belíssimas biografias:
Charles Miller - O pai do futebol brasileiro, John Mills.
João Saldanha: uma vida em jogo, André Iki Siqueira.
Nunca Houve um Homem como Heleno, Marcos Eduardo Neves.
O Artilheiro que não sorria, do Rafael Casé, sobre o Quarentinha.
Friedenreich
- A saga de um craque nos primeiros tempos do futebol brasileiro, do
Luiz Carlos Duarte.
Pelé é motivo de inúmeros
livros, o que eu mais gosto é: Primeiro Tempo – Pelé, organizado pelo Luiz Felipe H. A. Moura,
com textos do Benedito Ruy Barbosa, editado pela Magma Cultural.
Neco O
Primeiro Ídolo, Antonio
Roque Citadini, Geração Editorial, em 2001.
O Artilheiro
aviador, Gustavo
Longhi de Carvalho, Editado pelo Autor, em 2009.
Dias - A
vida do maior jogador do São Paulo nos anos 60. Fábio Mattos, Pontes Editores, em 2007.
Didi o Gênio
da Folha-Seca, de Péris
Ribeiro, 2ª edição Gryphus, em 2009 (1ª edição Imago 1993).
Não
poderia deixar de citar o livro:
Gigantes
do Futebol Brasileiro
- 2ª edição, de João Máximo e Marcos Castro, editado 2011 pela Civilização
Brasileira, com 439 paginas, são ótimas mini-biografias de 21 grandes craques.
HISTORIA
DOS CLUBES:
Corinthians Paixão e Glória, Juca Kifouri.
Palmeiras A Eterna Academia, Alberto Helena Junior.
Santos - Um Time do Céus, José Roberto Torero e Marcus Aurelius Pimenta.
São Paulo F.C. Saga de um Campeão, Ignácio de Loyola Brandão.
Os dois da Editora Mercado Aberto, do Ruy Carlos
Ostermann:
Até a Pé Nós Iremos – Grêmio
Meu Coração é Vermelho - Sport Club Internacional
O
jornalista Orlando Duarte recentemente escreveu três excelentes livros sobre o
“trio de ferro”, publicados pela Companhia Editora Nacional.
Em
2088, Palmeiras - O alviverde imponente, Corinthians - O Time da Fiel, junto com João Bosco
Tureta, em 2011, São Paulo F. C. - O Supercampeão, em conjunto com Mário
Vilela.
Não
se poderia deixar de serem mencionados os dois livros editados pela Fundação
Nestlé, Coração
Corinthiano do Lourenço Diaféria e Nação
Rubro-Negra do Edilberto Coutinho.
Corinthians e Flamengo têm merecido um maior numero de
livros, em razão do tamanho de suas torcidas.
HISTORIA
DA SELEÇÃO BRASILEIRA
Enciclopédia da Seleção - As Seleções Brasileiras
1914/2002, Ivan Soter.
Todos os Jogos do Brasil, Ivan Soter, André Fontenelle, Mario Levi
Schwartz, Dennis Woods e Valmir Storti.
A Primeira Vez do
Brasil - Campeão Mundial de 1958, Francisco Michielin.
HISTORIA DAS COPAS DO MUNDO
Com
a história das Copas do Mundo em 1987, Orlando Duarte publicou Todas as Copas do Mundo, que vai se
atualizando e em 1998 e se transforma em Enciclopédia - Todas as Copas do
Mundo, editada pela Makron Books. Em 2013 escreveu Paixão – O Brasil de Todos os Mundiais, editado pela aBook.
Em
2010 (ano de Copa do Mundo), foram editadas excelentes obras:
Almanaque
dos Mundiais, Max
Gehringer, Globo
O
Mundo das Copas, Lycio
Vellozo Ribas, Lua de Papel
Enciclopédia
das Copas do Mundo, Luiz
Fernando Baggio, Novaterra
Não
se poderia deixar de citar o escritor cearense, Airton Fontenele, autor de
vários livros que tratam de Copas do Mundo e Seleção Brasileira e que escreveu
em 2010 O Brasil em Todas as Copas.
CRONICAS
ROMANCES E FICÇÃO
Nestes gêneros, prefiro fazer uma tabela, para
facilitar.
Dos 16 indicados, três foram escritos por Claudio
Lovato Junior (que teve resenha neste site) e quatro editados este ano, o que
talvez mereça uma reflexão.
Título
|
Autor
|
Editora
|
Ano
|
A Saída do Primeiro Tempo
|
Renato Pompeu
|
Alfa Omega
|
1978
|
Maracanã Adeus - Onze Histórias
de Futebol
|
Edilberto Coutinho
|
Civilização Brasileira
|
1980
|
Por Um Grito de Gol
|
Vital Bataglia
|
EMW
|
1983
|
Todo esse lance que rola
|
Mauricio Murad
|
Relume Dumerá
|
1994
|
Contos de Futebol
|
Aldyr Garcia Schlee
|
Mercado Aberto
|
1997
|
A Colina dos Suspiros
|
Moacyr Scliar
|
Moderna
|
1999
|
Assim é o futebol
|
Luiz Fernando Kiehl
|
Writers
|
2000
|
Na Marca do Penalti
|
Cláudio Lovato Filho
|
34
|
2002
|
O Reserva
|
Rui Zink
|
Planeta Brasil
|
2004
|
Contos Brasileiros de Futebol
|
Cyro de Mattos (org.)
|
LGE
|
2005
|
Segunda Divisão
|
Clara Arreguy
|
Lamparina
|
2005
|
O Batedor de Faltas
|
Cláudio Lovato Filho
|
Record
|
2008
|
O Drible
|
Sérgio Rodrigues
|
Companhia das Letras
|
2013
|
O Ultimo Minuto
|
Marcelo Backes
|
Companhia das Letras
|
2013
|
Paginas Sem Gloria
|
Sérgio Sant’anna
|
Companhia das Letras
|
2013
|
Em Campo Aberto
|
Claudio Lovato Filho
|
Record
|
2013
|
Para
encerrar, toda a obra de ou sobre:
Thomaz Mazzoni, Nelson Rodrigues, Mario Filho, Armando Nogueira, José Lins do
Rego, João Máximo e João Saldanha, José Roberto Torero, estimo que sejam mais
uns 65 livros...
L.A:
O que acha do mercado
de livros sobre futebol? Quais as virtudes e os defeitos?
D.D:
Em 2013 já temos mais 150 livros lançados,
comprei poucos, tem faltado “fôlego” econômico para tal.
Em ano de copa de mundo sempre temos um aumento de lançamentos, não é o
caso deste ano, mas certamente será em 2014, ainda mais com a Copa sendo no
Brasil.
Sem dúvida nos últimos anos as biografias, histórias de clubes,
almanaques, crônicas e sociologia tem sido maioria em relação à ficção e
romances. Mas ainda estamos longe de ter uma literatura do futebol à altura do
nosso futebol. Conforme dizem os sociólogos:
“O futebol é um
retrato da sociedade, portanto a literatura do futebol retrata o que nós temos
em literatura. Não acho que seja o ideal, principalmente se considerarmos o
futebol como o esporte dos brasileiros”.
Footballmania – Uma História Social do Futebol no Rio de Janeiro,
1902-1938, de Leonardo Affonso de M. Pereira, Nova Fronteira, 2000.
Futebol Brasil Memória - De Oscar Cox a Leônidas da Silva, Claudio
Nogueira, Senac Rio, 2006.
A Dança dos Deuses-Futebol, Sociedade, Cultura, Hilário Franco
Júnior, Companhia das Letras, 2007.
Veneno Remédio - O Futebol e o Brasil, de José Miguel
Wisnik, Companhia das Letras, 2008.
O Futebol Explica o Brasil, de Marcos Guterman, Contexto, 2009.
Ensino e Memória - Histórias do Futebol, Lívia Gonçalves
Magalhães Arquivo Publico do Estado, 2010.
Pioneiros - Deus criou a bola e o homem descobriu o que fazer com ela, Orlando Duarte,
Editora Abook, 2011.
A Democracia
Corinthiana Práticas de Liberdade no Futebol Brasileiro, José Paulo Florenzano,
Educ.
Os Donos do Espetáculo-histórias da imprensa
esportiva brasileira, André
Ribeiro, Editora Terceiro Nome, 2007.
Memória
Social dos Esportes – Futebol e Política: A Construção de uma Identidade
Nacional, Francisco
Carlos Teixeira Da Silva e Ricardo Pinto dos Santos(orgs.), Mauad e Faperj,
2006.
L.A:
Por que o espaço dedicado aos livros de
futebol (e outros esportes) das principais redes de livrarias é tão pequeno?
Foi muito
pior, há 10 anos nem prateleiras tinham e entrar em uma livraria e pedir um livro que tratasse do futebol se
recebia um olhar, que o fazia parecer alguém que acabara de sair de uma
caverna, de “chanca” e todo sujo de lama...
Nos últimos anos tem ocorrido um acréscimo no lançamento de livro com o
tema futebol e já encontramos prateleiras, que poderiam ser maiores.
L.A:
Qual o livro que falta a literatura
esportiva?
D.D:
As biografias de Mario Filho, Tomaz Mazzoni e Armando Nogueira.
Minha biblioteca serve como uma diversão, mas muitas vezes me fez
refletir sobre a vida e certamente me enriquece como pessoa.
Para finalizar, “parodiando” o Prof. João Batista Freire no livro
Pedagogia do Futebol, diria que, se hoje, aos 75 anos de idade, alguém me
perguntar o que pretendo ser quando crescer, corre o risco de ouvir: “JOGADOR DE FUTEBOL!”
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