Djalma Santos nos deixou no dia 23 de julho de 2013. Djalma não, Dejalma. Isso mesmo, o
homem considerado um dos maiores laterais-direito do futebol mundial foi
batizado assim. Mas foi Djalma, um paulistano da gema, nascido em 27 de
fevereiro de 1929, no bairro da Luz, quem vestiu por mais de cem vezes a camisa
da Seleção Brasileira.
Djalma Santos começou a jogar em um clube de bairro, na
capital paulista. Foi para a Portuguesa, onde jogou durante onze anos.
Também
se consagrou no Palmeiras de 1959 a 1968. Foram 498 jogos, diversos títulos,
pela equipe consagrada como “Academia de Futebol”.
Pela Seleção Brasileira, Djalma Santos fez história em quatro
edições consecutivas, de 1954 a 1966. Na mais importante, a conquista do
primeiro título mundial brasileiro, Djalma jogou apenas a final, mas acabou
escolhido como o melhor lateral-direito da Copa.
Para conhecer melhor a vida de Djalma Santos, dentro e
fora dos gramados, Literatura na Arquibancada recomenda a visita ao site do
Museu do Futebol, que em parceria com a Fundação Getúlio Vargas, felizmente,
gravou um longo e histórico depoimento do atleta e homem.
Uma entrevista imperdível que você pode acessar nesse link http://cpdoc.fgv.br/museudofutebol/djalmasantos.
Uma entrevista imperdível que você pode acessar nesse link http://cpdoc.fgv.br/museudofutebol/djalmasantos.
Djalma Santos partiu sem ver a biografia lançada em abril de 2014, "Djalma Santos: Do porão ao palácio de Buckingham" (Editora Bellini Cultural), dos autores Flávio Prado, Adriana Mendes e Norian Segatto. Destacamos abaixo uma das crônicas do livro:
“Mário era um ponta esquerda fenomenal. Maluquinho, é
verdade, adorava dar dribles desconcertantes nos adversários, não para
humilhá-los, mas porque se divertia. Não tinha nenhuma objetividade. A torcida,
porém, o amava e ia a loucura quando as tais jogadas aconteciam. Era sempre
assim, todo domingo. Naquele domingo de verão de 1949, o Pacaembu fervilhava à
espera do Corinthians e do seu divertido ponta, Mário.
“O adversário era a Portuguesa, e, na lateral direita, um
desconhecido, Santos, “neguinho” troncudo, que estava lá prestes a ser a
próxima vítima. E não deu outra. Não havia passado nem dez minutos do primeiro
tempo quando Mário parou em frente a Santos (que ainda não tinha o Djalma no
nome), gingou, brincou, ergueu a bola, deu um chapéu e saiu pelo lado, enquanto
o estádio quase ia abaixo.
“Os torcedores do Corinthians ainda riam do lance quando,
novamente, a bola para o lado esquerdo do ataque alvinegro. Dessa vez, Santos
chegou primeiro. Poderia simplesmente se desfazer da bola. Mas para quê?
Esperou por Mário. Gingou, brincou, ergueu a bola, deu um chapéu e saiu jogando
com o requinte de fazer uma embaixadinha – que viraria a sua marca – antes de
lançar a bola para o ataque.
“A torcida engoliu o riso. Mário não acreditou no que
viu. “Que neguinho atrevido!” Os corintianos acabavam de ser apresentados
àquele que se tornaria o maior lateral-direito da história. Aquele lance
parecia dizer: “Muito prazer, meu nome é Santos. Djalma Santos”. Anos depois,
Mário e Djalma se transformaram em grandes amigos e riam muito lembrando
daquela ensolarada tarde de domingo.”
Mas, entre tantos escritos sobre ele, destacamos um especialíssimo, reproduzido no espetacular livro “Recados da Bola” (Cosac Naify, 2010), de Jorge Vasconcelos e Claudiney Ferreira.
Mais do que o depoimento do próprio Djalma detalhando
momentos inesquecíveis de sua vida, dentro e fora dos gramados, o capítulo sobre
o craque traz em sua abertura um texto fantástico escrito pelo craque da
literatura Paulo Mendes Campos. Era assim que Djalma era visto por ele:
“Vê Djalma Santos, indo e vindo, saltando, disparando,
correndo, chutando, cabeceando, apoiando, defendendo, corrigindo, ajudando, às
vezes, inexplicavelmente, até sorrindo em seu combate. Vê Djalma Santos e
reconhece logo: Ele acredita em Deus, é um servo de Deus, um lateral-direito de
Deus”.
Abaixo, um pequeno trecho do depoimento de Djalma Santos
concedido a outros dois craques, Jorge Vasconcelos e Claudiney Ferreira, que,
felizmente, eternizaram histórias incríveis de um verdadeiro gênio da bola.
Aviação interrompida
Meu nome é Dejalma dos Santos. O negócio do Djalma Santos
é porque fica mais fácil e rápido de falar. Além disso, quando fui convocado
para a Seleção pela primeira vez, havia o Nilton Santos, então simplificaram
para Djalma Santos e Nilton Santos.
Nasci em 27 de fevereiro de 1929, na cidade de São Paulo,
no bairro da Luz, na rua Prates. Sou casado com Mercedes de Campos dos Santos,
que me deu uma filharada. Em termos de estudos, fiz apenas o primário. Depois,
comecei a estudar para entrar na aviação, mas não cheguei a me formar por causa
de um acidente na fábrica de calçados onde trabalhava. Uma máquina prensou
minha mão, me limitou os movimentos. Por isso, fui impedido de continuar na
aviação. Tinha 17 anos.
Nasce um lateral
Desde 1945, eu jogava num time do bairro do Parada
Inglesa, em São Paulo, o Parada Inglesa Internacional. Alguns anos depois, em
1948, apareceu um senhor, ex-jogador da Portuguesa de Desportos, que me levou
para treinar no clube, onde viria a me firmar.
No início atuava como zagueiro central. Quando o diretor
da Portuguesa nos visitou, disse que precisava de dois jogadores, um para o
meio-campo, outro para o ataque. Nessa época eu ainda era amador. Então, o
Barros, nosso treinador, foi até onde estava a garotada e falou: “Leva o Djalma
e o Hugo”. Eu treinava como zagueiro. Quando cheguei na Portuguesa me puseram
no meio, mas como queria jogar de qualquer maneira, aceitei.
Virei profissional e foi tudo muito rápido. Ainda em 1948
comecei a jogar no time principal, me acertei, dei sorte. Luisinho era o
lateral-direito, jogávamos eu e o Hélio Leite no meio, além dos irmãos Piglia.
Veio então a contratação do Brandãozinho, um dos jogadores mais caros que
atuaram na Portuguesa Santista. Ele veio para a Portuguesa de Desportos, para
jogar na posição dele, que era o meio-campo, exatamente onde eu jogava.
O treinador veio até mim e pediu que eu jogasse de
lateral-direito. Também não reclamei. Graças a Deus funcionou e fiz minha
carreira como lateral-direito.
Mãozinha
Na hora de bater os laterais, como a minha mão já não
dobrava mais, por causa do acidente, era fácil arremessar a bola longe. De
certa forma, foi bom. Machuquei a mão, ela estava meio boba, mas o bom é que
pegava a bola e colocava onde queria.
Chapéu nos
Matarazzo
Minha mãe havia morrido. Ficamos só eu e minha irmã, que
trabalhava nas Indústrias Matarazzo. Quando fui a Santos jogar minha primeira
partida contra o time da casa, usava dois chapeuzinhos. A gente pegava aquele
trem da Cantareira que soltava muitas fagulhas. Os chapéus ficaram cheios de
buraquinhos. Naquele dia, os outros jogadores da Portuguesa fizeram uma rifa
dos meus chapéus; com ela, ganhei um dinheiro que não conseguiria em um mês de
trabalho, e ainda peguei os chapéus de volta.
Esse jogo contra o Santos foi minha estreia na equipe
profissional, na época ainda jogava no meio. A pedido do treinador, marquei o
Antoninho, um dos melhores jogadores do time deles. Perdemos o jogo, mas minha
atuação agradou e continuei na Portuguesa.
Após o episódio da rifa, conversei com minha irmã e pedi
para ela deixar o trabalho na Matarazzo. Expliquei que precisava me alimentar
melhor e caso ela continuasse a trabalhar, como é que eu faria para almoçar e
jantar? Ela ficou meio sem graça, mas consegui convencê-la de que com o que eu
ganharia no futebol daria para a gente viver.
Djalma na Seleção
Fiquei dez anos na Portuguesa. Saí para jogar no
Palmeiras no fim de 1958. Na Seleção, minha primeira convocação foi para o
Pan-Americano de 1952, no Chile. Quem me chamou foi o técnico Zezé Moreira. Eu
era reserva do Arati, lateral do Botafogo. Ele disputou a primeira partida e
não foi muito bem. Eu entrei e joguei o resto do campeonato. Vencemos o Uruguai
(a famosa desforra da derrota de 1950), na final batemos o Chile e enfim fomos
campeões.
Em 1953, joguei o Sul-Americano no Peru; em 1954, a Copa
da Suíça; em 1956, o Sul-Americano no Uruguai; em 1957, voltamos ao Peru e, no
ano seguinte, fiz a Copa da Suécia. Joguei na Seleção durante 16 anos, de 1952
a 1968.
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