O Corinthians é campeão mundial interclubes. Muito mais do que um título, o
Corinthians revelou ao mundo a força e dimensão da paixão de sua “louca”
torcida.
Impossível pedir a qualquer outro torcedor, de qualquer
parte do planeta (os do Chelsea compreenderam agora), que tente entender as
razões que levam o verdadeiro corinthiano a atos de “loucura” como vistos pelos
milhares de “loucos” que embarcaram para o Japão ou ainda aqueles que por aqui
ficaram na torcida pelo título mundial.
Na literatura esportiva há um livro que tenta explicar um
pouco desse sentimento alvinegro: Corinthians – 100 anos de paixão (Marco
Piovan e Newton Cesar, Magma Editora Cultural, 2010). E é nele que se encontra
a crônica de um dos grandes nomes do jornalismo brasileiro, Carlos Brickmann,
corinthiano de corpo e alma, que demonstra um pouco da cabeça desse “bando de
loucos” espalhados pelos quatro cantos do planeta bola.
Futebol é só
Corinthians
Por Carlos
Brickmann
Se Deus é o Bem, por que fez gente que não é corinthiana?
O Céu sabe das coisas. Se todos os seres humanos
recebessem a graça de poder torcer pelo Corinthians, não haveria outras
torcidas, aliás, desesperadas por não conseguir atingir essa nobre posição. Se
não houvesse outros times, como poderia o Corinthians mostrar sua superioridade
intrínseca?
É por isso que, no início dos tempos futebolísticos,
houve a Divina previsão de dois times: o Corinthians e o Outro (que, nas
conversas mais informais, costumamos chamar de Resto – mas este é um livro de
família, evitemos dar ao Outro os nomes pelos quais o chamamos normalmente).
O Outro tem uma única característica, reunir os
torcedores que, coitados, não são corinthianos. Por uma questão de facilidade
na organização de campeonatos, o Outro se subdividiu em seitas, que se fingem
antagônicas entre si, mas que têm, no fundo, um único adversário: o
Corinthians, o Glorioso e Insuperável. Essas seitas deram origem a Palmeiras,
Guarani de Bagé, PSV Eindhoven, Real Madrid, Chelsea, União de Araras, os dois
Manchester, o São Paulo, o Fluminense, o Brasil de Pelotas, o Galatassaray,
àqueles times de nomes impronunciáveis do Uzbequistão, da Alemanha (diga depressa:
Moenchengladbach), aos inúmeros Dinamo da Europa Oriental, a CSA, CRB, ao ASA
de Arapiraca, ao Íbis, aos XV de Jaú e Piracicaba, ao Barcelona, ao Sport
Recife, ao Vila Nova, ao Olympique de Marselha: são todos a mesma coisa, raspa
do mesmo tacho, cachaça da mesma pipa, e existem apenas em função de não ser o Corinthians.
Embora torcedor do Corinthians, sou imparcial: reconheço
que, em certos momentos, Pelé foi melhor do que Jô, e até mesmo do que Herrera.
Zico, em certos lampejos, chegou quase ao nível do grande Rodolfo Carbone, do
Ataque dos 103 gols. Rogério Ceni é bom de bater faltas, mas jamais igualará
Gilmar, Cabeção e Dida naquilo que um goleiro deve fazer, que é pegar faltas. E
chega: estamos aqui para falar do Corinthians, e não do Outro. Estamos aqui
para lembrar que o Corinthians foi campeão com Tobias no gol, com Tupãzinho de
centroavante, com Jairo no gol, e ninguém teve camisa para contê-lo.
Existe frase mais idiota do que perguntar quem é que vai
enfrentar o Corinthians? É difícil (já que o importante é o Corinthians, não
seu adversário), mas existe: é perguntar a um corinthiano como se sente bem não
por uma vitória efêmera, ou um troféu que vai ocupar espaço nos enormes salões
atulhados por taças e copas: sente-se bem por ser corinthiano. O resultado das
partidas, o resultado dos campeonatos é o de menos. Ganhar é bom, mas para o
corinthiano é como o glacê em cima do bolo: na verdade, gostoso mesmo é o bolo.
Como jornalista, já cobri Copa do Mundo (o Brasil perdeu
nos pênaltis), mas não me sentiria capaz de cobrir jogos do Corinthians. Não
abriria mão de meus princípios, e dificilmente um veículo de comunicação
deixaria de censurá-los:
1 – Não existe erro de
arbitragem em favor do Corinthians. Logo, não existe acerto de arbitragem
contra o Corinthians.
2 – O resultado da partida não
tem a menor importância. Importante é ver o Corinthians em campo e louvar suas
cores.
3 – Quando um jogador do outro
time se machuca, é fingimento. Conforme o caso, cartão amarelo ou vermelho no
ator que se faz passar por atleta.
4 – Quando um jogador do
Corinthians sofre falta, a deslealdade e a atitude antiesportiva estão
implícitas. Cartão vermelho no agressor.
5 – Juiz sempre apita contra o
Corinthians.
Corinthians é coisa séria. Ronaldo, o Fenômeno, lutou a
vida toda para poder chegar ao Corinthians.
Pelé, em sua longa e quase sempre
vitoriosa carreira, jogou na praia, jogou nos Estados Unidos, jogou na Seleção
paulista, jogou na Seleção Brasileira, participou de campanhas que levaram o
Brasil a três títulos mundiais.
Mas quem pode o menos nem sempre pode o mais:
frustrou-se por jamais ter conseguido vestir a camisa corinthiana, realizando o
sonho de toda a vida.
Sobre o autor:
Carlos Brickmann é jornalista e diretor do escritório Brickmann&Associados
Comunicação, especializado em gerenciamento de crises. Desde 1963,
quando se iniciou na profissão, passou por todos os grandes veículos de
comunicação do país. Participou das reportagens que deram quatro Prêmios Esso
de Equipe ao Jornal da Tarde, de São
Paulo. Tem reportagens assinadas nas edições especiais de primeiras páginas da Folha de S.Paulo e do Jornal da Tarde.
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