Pode se dizer que ele perdeu o charme ou a mística de
antigamente, mas ninguém seria maluco de afirmar que ele não continua a ser um
dos clássicos mais importantes e famosos do futebol brasileiro. Ainda mais
agora quando ele está perto de completar 100 anos de existência. No dia 7 de
julho de 1912 foi disputado o primeiro jogo entre Flamengo e Fluminense, com
vitória dos tricolores por 3 a 2. Um centenário que merece ser comemorado com
todas as pompas possíveis. E isso já está acontecendo.
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O troféu confeccionado para a festa do centenário do Fla-Flu. |
Pena que o estádio do Maracanã não esteja pronto para a
festa que será organizada pela Rede Globo. No dia 8 de agosto os dois times se
enfrentam no estádio do Engenhão, pelo campeonato brasileiro, com direito a
homenagens de primeira. Os dois clubes
e, evidentemente, a imensa torcida dos dois clubes, receberão diversas
homenagens. Primeiro um jogo preliminar entre astros da TV, música e ex-craques
das duas equipes. Há ainda um troféu, que será entregue pela TV Globo aos dois
times. Mas não é um troféu qualquer. A obra é dividida em duas metades, cada
uma para um clube. Criação do designer e diretor de arte da Rede Globo, Roberto
Stein. A metade tricolor ganhou o batismo de Nelson Rodrigues e a outra,
rubro-negra, Mario Filho.
Justa homenagem, não só aos dois clubes e ao clássico,
mas também aos irmãos Rodrigues. Nelson, tricolor assumido de corpo e alma.
Mario, dizem, rubro-negro.
Literatura na Arquibancada traz hoje o segundo artigo da série
especial sobre o clássico Fla-Flu, revivido em textos históricos publicados em
livros ou na crônica esportiva. O primeiro deles, se você não sabe, foi uma
crônica de Mário Filho, o “pai” do Fla-Flu. (http://www.literaturanaarquibancada.com/2012/06/o-centenario-do-fla-flu.html.
Agora é a vez do irmão Nelson Rodrigues, que este ano,
assim como o clássico Fla-Flu, completaria 100 anos, ou seja, a homenagem é
dupla. O texto é parte de um livro imperdível “Fla-Flu...e as multidões
despertaram!” (Edição Europa, 1987), organizado por Oscar Maron Filho e Renato
Ferreira.
Ah, o primeiro
clássico
Por Nelson Rodrigues
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Os dois times do primeiro Fla-Flu. |
Eu estou imaginando o campo, as duas torcidas e os times.
Mas para visualizar a partida temos de inseri-la no velho Rio, o Rio
machadiano, o Rio que era uma abundante paisagem de gordas.
Na belle époque, as mulheres iam para o futebol como se
fossem para uma recepção no Itamarati. E elas desmaiavam, vejam vocês, ainda
tinham ataques. De vez em quando, faço a mim mesmo esta pergunta: “Há quanto
tempo não vejo uma mulher com ataque?”. Elas matam e se matam, elas se atiram
do sétimo andar, elas devoram um tubo de comprimidos. Mas não tem ataques, nem
desmaiam. Ah, naquele tempo era lindo “ser histérica”. E, no futebol, quando
entrava um gol, as mulheres desfaleciam, pareciam morrer em estertores. Os homens
achavam sublime.
O primeiro Fla-Flu não era Fla-Flu. Só muito mais tarde é
que Mário Filho inventou e promoveu a abreviação. O Flamengo fez de tudo, tudo
para ganhar este primeiro jogo. Outro dia, conversei com um velho torcedor,
mais velho que o século. E ele, falando fino e baixinho (como uma criança que
baixa numa tenda espírita), contou o que foi o nascimento do maior clássico do
futebol brasileiro. O Flamengo era o time campeão do Fluminense, sem Oswaldo
Gomes.
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Cena do primeiro Fla-Flu. |
Parece que, na partida, o futebol era um detalhe
irrelevante ou mesmo nulo. Os dois times davam a sensação de que jogavam de
navalha na liga. E, no entanto, houve um cínico e deslavado milagre: ninguém
saiu de maca, ninguém saiu de rabecão. Mas nunca se vira, em campo de futebol,
ferocidade tamanha. E o Fluminense venceu.
Vejam como, histórica e psicologicamente, esse primeiro
resultado seria decisivo. Se o Flamengo tivesse ganho, a rivalidade morreria
ali, de estalo. Mas a vitória tricolor gravou-se na carne e na alma flamengas.
E sempre que os dois se encontram é como se o fizessem
pela primeira vez.
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