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Seleção Brasileira, na Copa de 1954. |
Há 60 anos, no dia 27 de junho de 1954, a seleção
brasileira que disputou a Copa do Mundo na Suíça protagonizou um espetáculo
histórico. Não de beleza tática ou estética do nosso futebol, mas de uma briga
monumental entre jogadores e policiais após o jogo que determinou nossa
desclassificação na competição para a poderosa seleção da Hungria.
No jogo que ficou conhecido como a “Batalha de Berna”, apesar de
vários jogadores e o técnico brasileiro, Zezé Moreira, terem participado das
trocas de bordoadas, a grande “cena” daquele dia chuvoso na Suíça coube a um
jornalista brasileiro. Paulo Planet Buarque, um dos mais famosos da imprensa
esportiva brasileira, foi parar na capa da mais importante revista europeia, a
Paris Match.
Literatura na Arquibancada resgata essa história contada pelo
próprio Paulo Planet em seu livro de memórias “Uma vida no plural” (Companhia
Editora Nacional, 2003):
“Na Copa da Suíça, em 1954, todos nós da Gazeta Esportiva fomos para esse país, muito antes do certame iniciar. Era a primeira vez que viajava para a Europa e era a primeira Copa do Mundo que se realizava no velho continente depois da Segunda Grande Guerra.
A viagem em si foi uma grande aventura. Partimos do Rio de Janeiro
num Constellation da Panair, com suas potentes turboélices. Fizemos escala em
Recife. Da capital pernambucana fomos para Dakar, no norte da África, depois
para Lisboa, até, finalmente, chegar a Zurique, na Suíça. Uma longa viagem!
Primeiro, acompanhamos os treinos da seleção nacional, sob o
comando de Zezé Moreira. Uma grande equipe, sem dúvida, da qual participavam
Castilho, Veludo, Nilton Santos, Brandãozinho, Djalma Santos, Maurinho, Humberto,
Rodrigues, Bauer e tantos outros craques.
Conhecíamos muito pouco os nossos eventuais adversários e fiquei
apreensivo ao ver a Hungria jogando. Nunca tinha visto, até então, futebol
igual!
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Brasil 1 x 1 Iugoslávia, Copa 1954. |
A nossa participação nesse Mundial foi uma sucessão de desastres. A começar pelo fato de desconhecermos até mesmo o regulamento da competição, a ponto de jogarmos a partida contra a Iugoslávia, lutando estoicamente pela vitória, quando o empate já nos classificaria para a etapa seguinte. Inclusive, nossos adversários tentavam nos dizer isso por meio de gestos. Depois, o infeliz discurso de Lyra Filho, o chefe da delegação, antes da partida contra a Hungria (que nos desclassificou), insistindo no sentimento pátrio, quando naquele momento precisávamos de tranquilidade e confiança, o que não desfrutamos porque passamos a noite acordados, pensando no imenso futebol que enfrentaríamos na tarde chuvosa de Berna.
Sinceramente, creio que, apesar de tudo, poderíamos ter vencido
aquela partida (pode ser ideia de torcedor). O jogo terminou em quatro a dois
para os húngaros, mas tivemos um gol anulado, que me pareceu válido, e um
pênalti contra o Brasil pelo menos discutível.
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A "batalha de Berna" |
Ao final dessa tensa partida, os dois times dirigiram-se para os vestiários, através de um mesmo túnel. Iniciou-se então uma briga geral entre os membros das comissões técnicas e os jogadores. Levamos a melhor e por nocaute técnico: Geraldo José de Almeida foi quem começou tudo; Zezé Moreira abriu a cabeça e a face do técnico húngaro; o supervisor Luiz Viana foi de uma coragem assombrosa e Veludo, nosso goleiro, foi um campeão de sopapos. Coitado do Maurinho que, procurando escapar daquela barafunda, pulou a mureta baixa e caiu, por engano, no vestiário dos húngaros, de onde foi devolvido pelos ares...
Vendo tudo de longe, não resisti a minha curiosidade jornalística
e dirigi-me para o “túnel da discórdia”. Não consegui meu intento, porque fui
impedido e agredido por um guarda suíço, mas que acabei levando ao chão com um
golpe de judô.
Meu sangue subiu à cabeça, não me contive e corri para juntar-me
aos brasileiros naquela batalha de Berna.
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Paulo Planet e sua "pernada" histórica. |
Saí numa foto de página inteira da revista Paris Match, mas, felizmente, fui identificado apenas como um torcedor brasileiro. Ato impensado, absurdo, notadamente por se tratar de um jornalista, mas, enfim, eu era jovem e, acima de tudo, torcedor do futebol brasileiro.
Felizmente, para mim, os jogadores brasileiros levaram-me
rapidamente para o vestiário. Mário Frugiuele, então presidente do Palmeiras,
foi quem me ajudou a deixar o estádio para fugir da prisão por agressão a um
policial. Ele me emprestou uma capa de chuva com a qual me cobri e saí sem ser
reconhecido. O bom Mário, um grande amigo, que há muito perdi!
Todas as experiências frustradas de campeonatos perdidos, inclusive os muitos títulos sul-americanos, produziram no futebol brasileiro profundas modificações nos anos seguintes, notadamente a partir de 1956, quando uma equipe brasileira excursionou pela Europa com novos valores, em busca de melhor identidade”.
Sobre a citação de Paulo Planet sobre “o infeliz discurso de Lyra
Filho antes da partida contra a Hungria” que nos desclassificou, Literatura na
Arquibancada recomenda a leitura do livro escrito pelo próprio chefe da
delegação brasileira, publicado pela Pongetti Editora, no mesmo ano de 1954.
Sobre Paulo Planet Buarque, acessar:
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