Nesta semana comemoram-se os 90 anos da Semana de Arte
Moderna. Uma data de extrema importância para a história da cultura brasileira,
um marco definitivo que levaria décadas para se consolidar ou melhor, evoluir
em diversas fases envolvendo centenas de nomes consagrados da cultura
brasileira espalhados em diversos segmentos como arte, pintura, literatura e
muito mais.
A Semana de Arte Moderna, realizada em São Paulo, nos dias
13, 15 e 17 de fevereiro, no Teatro Municipal, é considerada um divisor na
história da cultura brasileira.
O evento declarou o rompimento com o
tradicionalismo cultural associado às diversas correntes literárias e
artísticas existentes anteriormente como o parnasianismo, simbolismo e arte
acadêmica. Ela acabou se transformando no marco simbólico do surgimento do
Modernismo Brasileiro.
Artistas como os escritores Mário e Oswald de Andrade,
Manuel Bandeira, os pintores Anita Malfatti e Di Cavalcanti, além do músico
Heitor Villa-Lobos e o escultor Victor Brecheret, entre outros, buscavam
identidade própria e liberdade de expressão.
O modernismo seguiu sua “revolução” durante as décadas
seguintes à realização da Semana de Arte Moderna. Na série que o Literatura
na Arquibancada apresenta, hoje veremos um artigo escrito por Joel Rufino dos
Santos, historiador, professor, escritor e um dos
nomes de referência sobre cultura africana no país. Neste artigo,
publicado originalmente no site Almanaque Brasil
(http://www.almanaquebrasil.com.br/index.php?option=com_content&view=article&id=7144:a-semana-e-o-match-de-1922&catid=12935:historia&Itemid=141),
Joel Rufino faz uma
declaração histórica, principalmente, para aqueles que não
enxergam o futebol como uma cultura popular: “Nos acostumamos a pensar que só os acontecimentos políticos decisivos
são fatos históricos. E só os “grandes homens” são personagens históricos. Os
fatos esportivos, mesmo no “país do futebol”, correm por fora. Mesmo quando
enfurecem ou alegram a multidão, não merecem entrar nos livros de História,
ensinados em classe”.
A semana e o Match de 1922
Por Joel Rufino dos Santos
Notícia de jornal, 20 de fevereiro de 1922: Corinthians 2
a 1. Ontem, o bravo team do
Corinthians Paulista derrotou pelo score
de 2 a 1 o do Palestra Itália no ground
deste último.
Goals do forward Neco (2) e do full-back Baggio.
No ponto do bonds, após o match, um torcedor do Palestra,
inconformado, apunhalou um corinthiano.
Naquela mesma
semana, dias 13, 15 e 17, acontecera, no Teatro Municipal de São Paulo, a
Semana de Arte Moderna.
Se tivesse que eleger como fato histórico apenas um,
qual dos dois o leitor escolheria - o jogo ou a Semana?
Sabendo, desde o
colégio, que a Semana projetou grandes escritores, como Mário de Andrade;
grandes escultores, como Brecheret; além de músicos como Villa-Lobos, a
maioria de nós responderia: “Ora, a Semana”.
Nos acostumamos a
pensar que só os acontecimentos políticos decisivos são fatos históricos. E
só os “grandes homens” são personagens históricos. Os fatos esportivos, mesmo
no “país do futebol”, correm por fora. Mesmo quando enfurecem ou alegram a
multidão, não merecem entrar nos livros de História, ensinados em classe.
Olhemos mais de perto aquela notícia de jornal. Em primeiro lugar, está recheada de palavras inglesas: forward, ground, match… Até o nome do time vencedor, Corinthians, é homenagem a uma equipe bretã que andou por aqui, goleando as melhores equipes do Rio e de São Paulo. Isso indica que os ingleses é que nos ensinaram a jogar foot-ball no início do século 1920. E que deviam ter, portanto, uma grande e antiga influência em nossa sociedade.
Nossos primeiros
craques, rapazes da “sociedade”, imitavam os engenheiros e técnicos
industriais ingleses que praticavam cricket, squash e foot-ball em suas chácaras fechadas. Esse prestígio
dos costumes ingleses, por sua vez, se explica pela dominação econômica que a
Inglaterra exercia sobre nós desde o tempo de D. João 6º.
O derrotado
Palestra daquela partida é hoje o Palmeiras. Mudou de nome, mas ainda
concentra a preferência da colônia italiana. Em cada capital brasileira há ou
houve um “time de colônia”.
Burguesia,
dominação inglesa, colônia, imigração… Vê o leitor que uma pequena notícia de
jornal abriu janelas (links,
como se diz hoje) para diversos assuntos. A notícia lembrava que, um mês
antes, um torcedor corintiano, de regresso do estádio, agredira pelas costas
um palestrino no instante em que este último adentrava o portão de sua
residência.
Naquele ano de 1922, o futebol já era, então, paixão popular. Como foi possível, em 20 anos, um jogo frio de ingleses ricos se transformar em motivo de punhaladas e covardias no Brasil?
Que esportes o
nosso povo praticava antes? A porta da curiosidade está aberta, uma pergunta
conduz a outra, até o infinito. A Semana de Arte Moderna, a fundação do
primeiro partido comunista no Brasil, a rebelião tenentista, a inauguração do
rádio também são fatos de 1922. Em qualquer um deles, histórias puxam a
História.
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Sobre Joel Rufino dos Santos:
Nasceu
no Rio de Janeiro em 1941. É doutor em Comunicação e Cultura pela Universidade
Federal do Rio de Janeiro. Conhecido a partir de 1960 quando participou da elaboração
da revolucionária coleção de livros didáticos "História Nova", que o
levou algumas vezes aos cárceres da ditadura militar. Tem incursões em várias
formas de expressão escrita, do livro didático ao romance histórico, passando
também pelo teatro, pelos roteiros de televisão e pela literatura infantil.Foi
subtitular da Secretaria Extraordinária de Defesa e Promoção das Populações
Negras do Estado do Rio de Janeiro (1991/92) e presidiu a Fundação Cultural
Palmares do Ministério da Cultura. É autor de mais de vinte livros.
Serviço:
Para quem está em São Paulo, o Teatro Municipal, palco da
Semana de Arte Moderna, em 1922, terá várias opções para comemorar o evento com
óperas, concerto, música de câmara e dança. Os eventos acontecem entre os dias
15 (quarta-feira) e 26 de fevereiro. Confira a programação completa:
Para saber sobre a Semana de Arte Moderna e seus
personagens, Literatura na Arquibancada recomenda a leitura do site Prosa e
Verso, de O Globo:
http://oglobo.globo.com/blogs/prosa/posts/2012/02/03/os-90-anos-da-semana-de-arte-moderna-429930.asp
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