No próximo dia
30, comemora-se o Dia Nacional das Histórias em Quadrinhos. A data foi
instituída há 22 anos pela Associação de Quadrinhistas e Cartunistas do Estado
de São Paulo, com o objetivo de lembrar que em 1869, nesse mesmo dia, foi
publicada a primeira história em quadrinhos brasileira.
E a HQ também
tem muita história sobre o tema futebol. Literatura na Arquibancada começa
agora uma série sobre esse universo fascinante. Para começar apresentamos uma
reportagem especial, ou melhor duas, sobre a história da HQ ligada ao futebol.
O maravilhoso artigo foi publicado no site Universo HQ, principal referência da
internet brasileira quando o assunto é história em quadrinhos. O site também
está fazendo aniversário neste mês de janeiro quando completa 12 anos de vida.
Um site pra lá de confiável, vencedor de oito campeonatos consecutivos do
Troféu HQ Mix (a premiação mais importante do mercado). Ultrapassou a marca de
4 mil resenhas online servindo de base para muitos trabalhos acadêmicos.
Universo HQ tornou-se o maior banco de dados sobre quadrinhos da América Latina
– e um dos maiores do mundo.
O autor da
reportagem especial é o cearense radicado em Alagoas, Marcus Ramone, um dos
editores da Universo HQ. O artigo foi escrito em 2005 e tem a respectiva
autorização de seu uso. Abaixo, a segunda parte da reportagem. Nos próximos
dias, apresentaremos também outras produções do autor na HQ com o tema futebol.
Imperdível...
Reforços estrangeiros
Em qualquer lugar do mundo onde haja futebol e se produza
HQs, pode-se testemunhar a união de ambos. Do Chile, com o Condorito (às vezes
ele aparecia de chuteiras e com uma bola na mão, vindo de alguma pelada), à
Argentina, com o jogador Dico (o personagem, criado em 1971 pelo desenhista
José Luis Salinas, era artilheiro do Estrela F.C. e participava de aventuras
policiais fora de campo).
Ambos foram publicados no Brasil em revistas próprias, pela RGE, respectivamente nos anos 80 e 70. O condor chileno ainda voltou às bancas brasileiras em curta temporada, no começo da década de 1990, pela Editora Maltese.
Até o frio e "burocrático" futebol da Alemanha tem representantes nos quadrinhos. Kick Wilstra, criado por Henk Sprenger, era um jogador que enfrentava bandidos nas horas vagas. O personagem fez muito sucesso entre os alemães, na década de 1950.
E não só aqui os personagens Disney demonstram
paixão pelo futebol. Em países como Dinamarca, França e Itália, também chegados
numa pelota, é muito comum encontrar histórias do gênero.
Uma das mais memoráveis foi feita pelos italianos e
publicada no Brasil em 1986. Nela, Mickey e Pateta tentam voltar no tempo, mais
precisamente para 1970, para tirar fotografias exclusivas da final da Copa do
Mundo entre Brasil e Itália. Tudo dá errado e eles acabam indo para o futuro,
exatamente no dia e local da disputa da Copa 86. Enquanto o jogo se desenrola,
são mostradas apenas as expressões dos personagens, que ficam sabendo,
antecipadamente, quem venceu o campeonato.
A capa de Peninha # 1, lançamento da Abril em agosto de 2004, é outra prova do quanto os italianos gostam do esporte. O desenho foi feito na Disney Itália, e mostra o pato atrapalhado ao lado de Huguinho, Zezinho e Luisinho num campo de futebol alagado.
Curiosa foi a história O som da arena, feita nos
Estados Unidos e protagonizada por Cable, um dos muitos mutantes da Marvel
Comics. Publicada aqui na Wizard # 12 (Panini Comics,
setembro de 2004), mostrou, em algumas páginas, aquilo que todo mundo lá fora
já sabe: brasileiro é apaixonado por futebol. As cenas apresentavam o herói no
Rio de Janeiro observando um garoto mutante batendo uma pelada na praia com
seus amigos e usando superpoderes para cabecear uma bola que vinha muito alta.
Os chamados quadrinhos autorais também prestaram sua homenagem ao futebol. Vários cartuns do argentino Mordillo (cultuado na Europa e pouco conhecido aqui), e Os Campeões (lançado no Brasil pela Meribérica/Líber), obra do turco Gürcan Gürsel, são dois excelentes exemplos. Donos de traços diferentes entre si, têm em comum a paixão pelo esporte das massas e um humor inteligente que se traduz na forma como produzem seus álbuns: gags puras, sem nenhum balão ou recordatório, no máximo uma onomatopéia aqui e ali.
O também argentino Sergio Más lançou, em 1998, o livro de
cartuns Futbol de Más, com a participação de alguns cartunistas
brasileiros.
E um futebol futurista, com jogos violentos em verdadeiras batalhas campais, foi mostrado, em 1987, na obra Hors Jeu, de Enki Bilal e Patrick Cauvin.
Ainda há O mini-guia do futebol, HQ dos franceses Bruno Madaule e Gaston. Publicado recentemente em vários países da Europa, o álbum bem que poderia circular pelo Brasil, já que Portugal verteu a obra para nossa língua.
De nossa pátria-mãe vem Pantera Negra Eusébio,
homenagem em HQ ao maior jogador português da história do futebol, o atacante
Eusébio, artilheiro da Copa da Inglaterra, em 1966. O álbum foi lançado em 1990
pela Meribérica, com desenhos de Eugénio Silva.
Até na terra do Sol nascente, sem nenhuma tradição futebolística (mas que vem se interessando pela coisa há alguns anos - Zico que o diga!), vez ou outra se produz alguma HQ com o tema.
Em 1982, surgiu o mangá Captain Tsubasa (criado por Yoichi Takahashi), com as aventuras do jovem Oliver Tsubasa, que sonhava em ser campeão de juniores pelo Japão. O primeiro tomo da série foi até 1989.
No ano de 1994 veio o segundo tomo, no qual o personagem
jogava no São Paulo. Isso se justificava pelo fato de o clube ter ganhado duas
decisões da Copa Intercontinental Toyota, em Tóquio, em 1992 e 1993 e gozar de
muito prestígio por lá. Nas histórias ainda apareciam outros times brasileiros,
como Flamengo e Grêmio. Recentemente, Tsubasa se transferiu para o Barcelona.
Por aqui, o personagem só deu as caras em animê. O mangá ainda é publicado no Japão, numa nova série, com a impressionante tiragem semanal de 1,5 milhão de exemplares.
Outro trabalho de Yoichi Takahashi também sobre futebol é: Syukan Shonen Champion.
O Rei em quadrinhos
Pelé, o maior expoente do futebol em toda a História e
talvez a personalidade mais conhecida do planeta, já honrou as HQs com sua
presença. Além de contracenar com o Zé Carioca, o Rei ainda apareceu na capa do
especial Super-Homem versus Muhammad Ali, publicado no Brasil nos anos 70, pela Ebal.
Na ilustração, ele assiste à luta ao lado de outras figuras famosas da política
e das artes.
Assim como se formaram mitos em torno das façanhas de Pelé nos gramados, também existe uma lenda sobre ele nos quadrinhos. Lee Falk, criador do Fantasma, afirmou numa entrevista ao Jornal da Tarde (de São Paulo), em 1996, que o rei do futebol ajudou o Espírito-que-Anda numa aventura produzida no Brasil.
O fato é que não se sabe que editora realizou tal façanha: RGE/Globo, Saber ou Ebal, que publicaram o herói em diferentes épocas em nosso país. Infelizmente, não se encontra registro dessa história, mas se o próprio Lee Falk disse que ela existe...
No final da década de 1970, Pelé ganhou participação mais que efetiva nos quadrinhos, quando Mauricio de Sousa criou Pelezinho. Estreando em tiras de jornal e depois ganhando seu próprio gibi na Editora Abril, o personagem fez muito sucesso não só no Brasil, mas em outros países da América do Sul.
Os coadjuvantes de Pelezinho eram todos baseados em
amigos de infância do Rei. Um dos mais divertidos da turma era o (arremedo de)
goleiro Frangão. Até Dondinho, o pai de Pelé, aparecia nas histórias.
A revista mensal do pequeno craque durou até 1982, e por mais quatro anos foram lançados almanaques periódicos com republicações, incluindo os especiais da Copa do Mundo de 82 e de 86 (em duas edições).
Quando os Estúdios Mauricio de Sousa foram para a Editora Globo, o personagem ganhou um almanaque em 1988, além do especial Copa 90 (que apresentava histórias inéditas, e numa delas havia até um encontro entre Pelé e Pelezinho) e um álbum em comemoração aos 50 anos do rei do futebol.
Em 1990, Mauricio de Sousa cogitou a volta do personagem com um visual bem diferente, agora um pré-adolescente. Anos depois, em 2002, essa nova imagem foi apresentada em propagandas nas revistas da Turma da Mônica e em sites pela internet. Mas a ideia não seguiu adiante.
Restou só a saudade do maior craque que os quadrinhos já revelaram para o futebol - ou seria o contrário?
Supercraques
Em 1995, o então diretor de redação da revista Placar, Marcelo Duarte, teve a ideia de revitalizar as mascotes dos clubes de futebol, as quais achava ultrapassadas. Pensou em algo que significasse o poder e a força que os times representam.
A Era Image, na qual supertipos anabolizados e
anatomicamente inverossímeis eram a bola da vez, estava no auge. Assim, sob
encomenda do jornalista, a equipe do estúdio Art & Comics seguiu a
tendência e transformou as velhas e passivas mascotes nos Super-Heróis da Bola:
Mega Timão (Corinthians), Power Urubu (Flamengo), Lança-Chamas (Botafogo),
Cyberpork (Palmeiras), Galo Vingador (Atlético-MG), Fox (Cruzeiro) e outros
formavam o mais novo esquadrão de paladinos da justiça.
A Editora Abril pretendia popularizá-los até que pudessem ganhar uma revista própria. Durante vários números da Placar, eles foram tema de matérias, capa de edição e chegaram a ganhar um superpôster e uma história curta. Mas a iniciativa não surtiu efeito, as vendas não demonstraram que o público ficara animado com a inovação e o projeto foi engavetado.
De qualquer forma, foi um divertido exercício de imaginação que entrou para a história da mais longeva revista de esportes do País.
Também em 1995, inspirado nas "supermascotes",
este articulista fez uma montagem que consistia no Ciclope (líder dos X-Men),
vestindo a camisa do Flamengo e segurando a cabeça do ex-jogador Renato Gaúcho,
o então algoz do time rubro-negro (autor do gol que tirou o título carioca do
rubro-negro naquele ano). Batizada de X-Mengo, a imagem foi publicada na Placar
especial de 100 anos do time carioca.
Mas os quadrinhos continuaram fazendo parte da revista. Tiras de humor e charges são seções fixas na Placar há muitos anos. A hilária coluna Lendas da Bola, de Milton Trajano, é um belo exemplo disso.
Diante de tudo que se viu, não resta dúvida: nos quadrinhos o futebol também é alegre, faz sorrir e chorar, produz tabelas perfeitas e até as goleadas surgem com mais freqüência.
O único problema é que não é possível xingar o juiz. Mas isso parece não fazer falta, pois os leitores já têm seu próprio saco de impropérios: o editor.
Sobre Marcus Ramone:
Cearense radicado em Alagoas, o marketista e
jornalista Marcus Ramone é flamenguista "flanático" e editor
do site Universo HQ. Foi articulista da extinta
revista Flashback (Editora Abril) e da Crash (Escala), colabora com
jornais e revistas de várias partes do Brasil e é diretor de marketing de uma
rede de óticas do Nordeste.
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