Por Hélio Alcântara
O que houve com o time
do Santos, em Yokohama?
Me preparei para ver
um espetáculo de futebol, uma final de torneio como há muito não via. Procurei
me distanciar da torcida pelo time da Vila Belmiro e analisar, friamente, o que
as duas equipes poderiam realizar em campo. Pensei que o Peixe entraria
mordendo e marcando a equipe azul-grená lá na frente, no campo de
defesa adversário, onde há maior vulnerabilidade (talvez, a única), com o
grandalhão Piqué e/ou o carniceiro Mascherano. Imaginei que ficar recuado (como
o time do Catar), suportando a "irritante" troca de passes para
tentar um contra-ataque não seria uma boa estratégia - cedo ou tarde, os
maravilhosos Messi, Xavi e Iniesta furariam o bloqueio e marcariam um gol.
Nos dias que anteceram
à final, li, e observei nas entrevistas, que os espanhóis nutriam respeito pelo
Santos, inclusive, porque não o conheciam. Puyol elogiou Neymar e disse que
havia entre os espanhóis "um pouco de medo" dele, o garoto que
poderia decidir uma partida sozinho. O técnico Guardiola reconheceu que não
tinha grandes informações sobre o ex-time de Pelé, mas que iria estudá-lo
nos próximos dias. E assim o fez.
Mas, assim que vi as
imagens das duas equipes na "ante-sala" do gramado, ainda
naquele corredor entre os vestiários e o campo, fiquei incomodado. O semblante
dos jogadores santistas era quase pesado, e Neymar, último da fila,
parecia pouco à vontade. O único que pareceu sentir a atmosfera paralisante a
rondar os onze titulares foi o veterano Léo. Tanto que bateu palmas com vigor,
como se quisesse acordar seus companheiros da letargia. Por outro lado, Messi e
os demais jogadores do Barça tinham o semblante tranquilo e o olhar
concentrado. Ainda assim, certo de que minhas sensações não procediam, me
preparei para ver um espetáculo de futebol.
Mas, ao final dos 90
minutos, que bem poderiam ter sido 120, estava frustrado. Frustrado porque os
jogadores do Alvinegro simplesmente não jogaram bola. E entristecido porque
meus filhos pequenos choravam - vocês bem sabem que a dor dos filhos dói bem
mais fundo em nós.
No primeiro tempo, os
santistas assistiram, paralisados e embasbacados, à troca de bolas entre os
jogadores do Barcelona. De repente, o deslumbrante time espanhol tornou-se
imenso, gigantesco, inalcançável. Imbatível.
Me lembrei de que
Neymar, Ganso e outros jogadores jogam videogame e escalam jogadores do
Barça em seus times ideais. Como num passe de mágica, Neymar já não tinha
Puyol em suas mãos, sob total controle dos seus dedos, mas, sim, diante de
si. Puyol tinha carne, osso, olhos de bicho feroz, chuteiras, calções e um
manto azul-grená.
Os moleques sentiram a
barra da decisão. Me lembrei da minha infância, quando assistia, à beira do
campo, a verdadeiras batalhas entre times de várzea, no antigo bairro do Capão
Redondo, zona sul de São Paulo. Quem era menino - mesmo bom de bola - não podia
enfrentar os adultos, que batiam sem dó. Na final do Mundial Interclubes,
no Japão, os moleques do Peixe jogaram acuados, com medo de importunar os
astros do atual melhor time do planeta. Ou, pensando cá com meus
devaneios, será que eles não conseguiram jogar simplesmente porque os
"adultos" estavam do outro lado e sabiam, como ninguém, o que fazer
com a bola?
Muricy, que considero
um dos melhores técnicos do mundo, escalou um time extremamente cauteloso e que
não vinha atuando dessa maneira, com três zagueiros. Léo vinha de um tempão
parado. E a armação da equipe ficou a cargo apenas do cérebro e das pernas de
Ganso. A bola não chegava nem a Borges, nem a Neymar. O meio-campo do
Barça deitou e rolou, assim como o ataque. Além disso, em vários
momentos, Daniel Alves e Abidal encontraram avenidas vazias pelas
laterais.
Ao final de tudo,
ficou o entendimento de que o título mundial só poderia mesmo pertencer aos pés
dos magníficos Messi, Iniesta e Xavi e ao cérebro de "Pepe"
Guardiola. Ao Santos resta ter aprendido várias lições e se preparar para
ganhar a Libertadores novamente, em 2012. Viva os Meninos da Vila! Viva Neymar,
esse menino-cracaço de 19 anos! Viva Messi, esse monumental jogador. Viva
o Barcelona, dono de uma das histórias mais comoventes da vida política espanhola.
Ah, e, de quebra, "dono" do melhor futebol do mundo.
Sobre Hélio Alcântara:
É jornalista e ex-chefe do Departamento de Esportes da TV Cultura.
É autor dos livros "Viveiro" (poesia,
1981) e do romance juvenil, "Ponta de Lança- A história de um brasileiro que foi jogar bola nos Estados Unidos e descobriu o mar" (Editora Ysayama, 2000).
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