Mais uma história espetacular do
Dr. Sócrates. Desta vez extraída do recomendadíssimo livro “Recados da Bola –
Depoimentos de doze mestres do futebol brasileiro” (Editora Cosac Naify, 2010).
O livro tem organização de Jorge Vasconcelos e foi feito a partir de entrevistas
feitas pelo jornalista Claudiney Ferreira e pelo próprio Jorge Vasconcelos com
12 feras do futebol brasileiro: Barbosa, Domingos da Guia, Jair Rosa Pinto,
Zizinho, Ademir de Menezes, Djalma Santos, Bellini, Nilton Santos, Zito, Didi,
Rivellino e, claro, o Dr. Sócrates.
Foi fora do campo que “Magrão”
teve de começar a usar a criatividade para conciliar futebol e medicina.
Na minha vida, o futebol foi um
acidente de percurso. Gostava muito de esporte e o futebol sempre foi o meu
esporte predileto. Quando tinha catorze anos fui jogar no Botafogo de Ribeirão
Preto. Jogava no juvenil, toda a turma do colégio foi para lá; eu acabei
ficando.
Logo de cara, no Botafogo,
começou uma pressão para que eu me profissionalizasse. Mas sempre achei
impossível conciliar os estudos e o futebol.
Nessa época, eu fazia cursinho e
logo depois entrei na faculdade. Só aparecia no clube aos domingos, para as
partidas. No segundo ano da faculdade, disputava o campeonato amador como
juvenil e jogava contra um pessoal bem mais velho.
No final do segundo ano do curso,
tive umas férias longas – minhas últimas férias longas – e foi quando resolvi
aceitar o convite para tentar conciliar as duas coisas, o que também
representaria uma forma de independência em relação ao meu velho.
Mas, sinceramente, eu não
acreditava que fosse possível me dedicar aos estudos e ao futebol. Era muito
complicado porque minha carga horária era puxada, no mínimo doze horas por dia.
Não podia treinar e vivia num regime de absoluta exceção.
(...)
Era comum chegar em cima da hora
dos jogos. Não podia deixar de freqüentar alguns cursos, tinha mesmo de
assistir a certas aulas. Quando jogávamos em São Paulo, Sorocaba, Bauru, eu
saía de Ribeirão Preto às seis da tarde e ia para o jogo. A delegação do Botafogo
chegava ao local da partida na véspera, e eu só depois.
Então houve o episódio
do Pacaembu.
Nunca havia jogado lá e cheguei em cima da hora, num jogo do
Campeonato Paulista, no meio da semana. Não sabia onde ficava o vestiário, o
motorista que me levou também não. Disse para ele: “Me deixa aqui que eu compro
ingresso, entro no campo e lá resolvo”.
Dentro do campo, comecei a perguntar
onde era o vestiário, aí um cara falou que era do outro lado. Talvez tenha sido
a única vez na vida que corri para jogar bola. Nem em campo corria tanto. A
essa altura, tive de negociar com um porteiro; disse a ele que iria jogar e ele
não acreditou, deu uma risadinha. Mas o mesmo porteiro aceitou chamar alguém do
Botafogo – acho que sentiu que eu realmente pertencia ao grupo. Me
identificaram, ele me deixou entrar e joguei. Isso foi em 1974, no primeiro
Campeonato Paulista que disputei.
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