Por André Ribeiro
Será que só eu vi aquele olhar
quando a câmera de televisão o focalizou do lado de fora do campo, atrás das
placas de publicidade?
Com certeza não. Os olhos
arregalados acompanhavam alguma jogada do lado de dentro do campo. Seu time ainda
não estava perdendo, mas, ali, do lado de fora, ele sabia que se algo de errado
acontecesse do lado de dentro do campo ele poderia ser a única solução.
A câmera não mostrou e muito
menos nenhum dos quase 40 mil torcedores, além do batalhão de repórteres que
estavam ali, bem ao seu lado, percebeu qual fora a sua reação naquele instante
que beirava a tragédia. O título tão sonhado estava indo pelo ralo. Rostos em
pânico, torcedores das poltronas protestando, xingando o treinador, excomungando
esse ou aquele jogador menos ligado na partida eletrizante.
Do lado de fora, esticando os
músculos e olhando para as arquibancadas, ele viu um companheiro de equipe
perder uma bola na intermediária adversária e sair na captura do jogador em
desespero. Mais alguns metros e uma falta fora marcada. Em mais alguns
segundos, ele estava fechando os olhos bem apertados, como se não acreditasse
no que acabara de ver. Gol do adversário. Tudo que ele menos queria estava
acontecendo. Ou será que ele queria exatamente o que estava prestes a
acontecer?
Das arquibancadas chegou o coro
do seu nome em uma só voz: Adriaaaaaano, Adriaaaaano...
Cederia o treinador filósofo ao
apelo popular?
Começou a apertar ainda mais o aquecimento...Os
músculos entravam em agitação...O coração pulsava cada vez mais rápido...
- Chama o Adriano.
Naqueles passos em direção ao
banco, pensou consigo mesmo: “Meu Deus, e agora...”
No clima em que o jogo
transcorria, seria capaz de entrar e transformar aquele fim que se anunciava
trágico para quase 40 mil pessoas e outros milhares de olhos grudados à frente
do aparelho de televisão?
Observando seu olhar, parecia
assustado. Acho que sequer imaginava ter de entrar para jogar. Muito menos numa
situação como aquela de placar adverso e o sonho de título indo embora com a
derrota. A torcida sabia que estava fora de forma. O equipamento de proteção às
canelas sequer estava colocado. Perdeu alguns segundos ainda tendo de
prendê-las com ataduras, mas nesse instante, seu olhar já era para o lado de
dentro do campo. Cada volta que dava na atadura, imaginava o que poderia fazer
quando estivesse em instantes ali, correndo em busca de um gol.
O faro do gol...
Alguns minutos se passaram e em
um contra-ataque, antevendo aonde a bola deveria ser rolada, indicava
freneticamente com um das mãos o lugar em que ela tinha de ser rolada dentro da
área adversária. O pensamento sabia o que deveria fazer, mas o corpo pesado
iria permitir que tudo que pensara naquela fração de segundos aconteceria na
prática?
O faro do gol...
Ele sabia o que fazer, mas ainda
restava uma única barreira...O goleiro com as duas mãos esticadas vibrando como
se dissesse a ele: “chuta que eu vou pegar”.
O faro do gol...
Um ano e cinco meses depois, ele
conseguiria superar essa abstinência? O chute colocado milimetricamente teve de
esperar alguns segundos até ter seu desfecho final. Seu olhar foi captado pelas
câmeras das tevês. O mesmo olhar captado alguns minutos antes quando estava do
lado de fora. E aquecia... e sofria com a hipótese de ter de entrar naquele
jogo. Em menos de 2 segundos, tudo que passara nos últimos meses estava prestes
a ter fim. Poderia sair tranqüilo novamente nas noites do Rio ou de São Paulo
para “comemorar” com quem quisesse sem ser questionado.
Onde ele estaria agora?
Não importa. Com o dever
cumprido, ele pode ir onde bem entender e com quem quiser, com a certeza de ter
feito sua obrigação.
Um único gol pago com milhões de
reais de sua contratação. Valeu a pena esperar? Pergunte a qualquer torcedor e
a resposta não será difícil de descobrir.
(crônica sobre o jogo Corinthians 2, Atlético Mineiro 1, campeonato brasileiro 2011. Adriano marcou o gol da vitória aos 44 minutos do segundo tempo)
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