Mais um personagem "dono do espetáculo", nas ondas do rádio esportivo brasileiro. O texto abaixo faz parte do livro "Donos do Espetáculo - Histórias da Imprensa Esportiva no Brasil" (Editora Terceiro Nome, 2007).
*******
Em maio de 1941, o rádio
esportivo brasileiro conheceria uma de suas maiores estrelas, Oduvaldo Cozzi,
que reinou absoluto durante os dez anos seguintes na Rádio Mayrink Veiga, do
Rio de Janeiro. O convite para trabalhar na emissora carioca foi feito por Edmar
Machado, que conhecia muito bem o gênio que estava contratando. Gênio e
genioso, porque além de craque do microfone, Cozzi tinha temperamento forte.
Durante os sete anos anteriores ao de sua contratação pela Mayrink, Cozzi
perambulou por algumas emissoras de São Paulo e do Rio de Janeiro. Em 1934, aos
19 anos de idade, decidiu trocar o curso de Direito na Faculdade do Largo São
Francisco, em São Paulo, onde cursava o terceiro ano, por uma vaga de locutor
na Rádio Cosmos, da capital paulista. Pouco depois, teve rápida passagem pela
Rádio Ipanema do Rio de Janeiro e, em 1935, transferiu-se para a Rádio
Transmissora, outra emissora carioca, onde permaneceu por apenas três meses.
A grande oportunidade na carreira
de Cozzi surgiu em 1936, quando foi convidado por Gilson e Gesolino Amado para
integrar o cast da Rádio
Nacional. Começou como speaker de
estúdio, passou ao departamento de esportes, onde narrava os jogos e as
primeiras corridas de automóvel no Circuito da Gávea, e durante um ano acumulou
o cargo de diretor artístico. Foi Cozzi quem, na Nacional, apelidou um dos
maiores ídolos da música brasileira, Orlando Silva, de “O cantor das
multidões”.
Todos esses detalhes só puderam
ser levantados graças aos cuidados das cinco filhas do locutor que ainda moram
no Rio de Janeiro e cuidam carinhosamente de tudo o que pertenceu ao pai em
vida: “papai tinha fama de popstar. Recebia centenas de cartas de fãs
apaixonadas. Até nós, da família, nos beneficiamos, pois aparecíamos em muitas
fotos das principais revistas e jornais da época”, relembra Tânia Cozzi. Em uma
mala cheia de papéis e documentos, Cozzi guardou diversos jornais e roteiros
dos caminhos percorridos em sua longa trajetória profissional. Num dos relatos,
revela: “a primeira transmissão de futebol que fiz pela Nacional foi entre as
seleções paulista e gaúcha, no estádio de São Januário. Só conhecia três
jogadores”.
Oduvaldo Cozzi ficou na Rádio
Nacional até 1939, quando se demitiu por desentender-se com a direção artística
da emissora: “acumulava o cargo de locutor e diretor artístico. Eles não
gostaram de uma contratação que fiz para o cast
da emissora. Não sei o que tinham contra o nome de Dorival Caymmi. Fiquei tão
chateado com tudo que, logo que pedi demissão, sai caminhando pela avenida Rio
Branco. Fiquei desempregado apenas por algumas horas. Para minha sorte,
encontrei no caminho Breno Caldas, que ao saber de minha saída da Nacional,
convidou-me para assumir a direção da Rádio Gaúcha, de Porto Alegre. No dia
seguinte já estava trabalhando no sul do país”.
Cozzi ficou na Rádio Gaúcha de
abril de 1939 a janeiro de 1940. Lá fazia de tudo um pouco, inclusive
radioteatro. Foi lá também que conheceu e se casou, em janeiro de 1940, com
Alba de Rezende, com quem teve cinco filhas. Inquieto, o narrador retornou a
São Paulo para cumprir um resto de contrato – apenas dez meses – que tinha com
a Rádio Tupi. Para ocupar sua vaga, outra futura estrela do rádio: Pedro Luiz. Cozzi voltou ao sul do país, onde
permaneceu por apenas oito meses até pegar novamente o avião e desembarcar no
Rio de Janeiro para assumir o comando da Mayrink Veiga.
O rádio esportivo brasileiro não
seria mais o mesmo: “Cozzi fez uma revolução no rádio, pelo estilo de
transmitir. Era uma voz anasalada. Na verdade, ele imitava em detalhes o consagrado
locutor uruguaio, astro do rádio argentino, Lalo Pelicciari, que transmitia
mais ou menos assim: ‘falt, puneo o juiz’. Aqui, Cozzi adaptou: ‘Fauuu, puniu o
juiz’. Lá Pelicciari dizia: ‘off side’, com firmeza. Aqui, Cozzi repetia:
‘im-pe-di-do’, como se estivesse separando as sílabas de maneira firme e
linear”, relembra o também narrador Luiz Mendes. Cozzi copiaria outro modelo de
transmissão do astro argentino, colocando atrás dos gols Canarinho e Mário
Tereré, então chamados não de repórteres, mas de “pontas”: “Pelicciari lá:
‘abla Canner’. Aqui o Cozzi: ‘fala Canarinho’”.
Em pouco
tempo, passou a desfrutar de enorme prestígio nos bastidores da política do
futebol. Os principais dirigentes esportivos do país freqüentavam sua casa com
regularidade e, aproveitando-se dessa rotina, passou a comprar eventos para
transmitir com exclusividade pela Mayrink Veiga, entre eles o Campeonato
Sul-Americano de 1942, disputado em Montevidéu, no Uruguai.
Um pouco da
voz de Cozzi:
Nenhum comentário:
Postar um comentário